Henri Durville

O iniciado recebia, então, a noção de um deus único. Depois, perguntava-se como cada força da Natureza personificada em um deus ou uma deusa podia operar isoladamente, mas, no momento em que estavam seguros de sua inteligência e discrição, mostravam-lhe que todos os deuses e deusas não tinham forças, faculdades ou atributos de Amon-Ra, que só existe fora do tempo e do espaço. Só ele é vivo; só ele é o Ser; os deuses, como os outros seres, são apenas emanações, o aspecto longínquo de seus poderes. Estas lendas harmoniosas, estas personificações, cujos aspectos alimentam a arte dos escultores e pintores sagrados, tudo aparecia então como a imagem da verdade, a transparente túnica onde a sua forma é velada aos olhos do vulgo e não se deixa ver senão aos olhos capazes de penetrar a grandeza e a beleza. Partindo deste ponto de vista, o iniciado não deixa guardar mais sentimentos pessoais, porém abandona o seu coração ao amor de todas as criaturas emanadas como ele do seio luminoso de Amon-Ra, chamadas, como ele, à reabsorção quando soasse a hora. Não conservava de suas afeições passadas senão o culto da família, de seus antepassados, próximos e longínquos, dos quais a forma e o duplo residiam nos túmulos consagrados. Uma imensa ternura o invadia e, à imagem do Sol que verte a sua luz sobre os bons e os maus, sobre o inseto e a estátua divina, sentia expandir-se nele a flor mística do Amor!   Assim, desprendido de tudo o que passa, ele empreendia o novo ciclo, a última experiência que o devia conduzir à luz absoluta, mas esta luz não se manifesta senão àqueles que são mortos para as coisas do mundo. Eis porque esta experiência tinha lugar em um sarcófago. O adepto era colocado em um sarcófago aberto e devia passar toda a noite em meditação e prece. Deixavam-no inteiramente só neste leito funerário, no meio das mais espessas trevas e, apesar disso, o quadro deste abandono era de tal modo triste e sinistro que ele sentia o espanto deslizar sobre si mesmo e gelar a sua vontade. Era um momento cruel em que era necessário fazer brilhar todo o domínio que tinha adquirido sobre as suas impulsividades. Dominava o seu espanto e, no silêncio absoluto, em tudo semelhante à morte, pedia a iluminação. Então ela lhe era imediatamente concedida. Certamente, sentia a sua força vital abandonar o seu corpo; porém, que importa o corpo àquele que sabe que é apenas o invólucro transitório de um ser quase divino? Desprendia-se em espírito deste invólucro mortal, e, impelido pelas asas das correntes superiores, no silêncio augusto do túmulo, as palavras eram reveladas aos que conduziam a luz no mais íntimo de seu ser. Identificava-se a Osíris; misturava-se ao Deus imortal, princípio da vida e da luz.

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