Lytton

Considere os mais simples elementos do saber comum. Pode cada discípulo converter-se em mestre, somente por meio do seu desejo e da sua vontade? Pode o estudante chegar a ser Newton, apenas por ter comprado uma geometria? Pode um jovem, porque as Musas o i nspiram, prometer-se igualar o Homero? Pode aquele pálido tirano, por mais que registre todas as leis e os pergaminhos antigos e por mais que conte com as armas do seu exército, confeccionar uma constituição menos viciosa, que não venha a ser derrubada, num momento, por um populacho frenético? Quando, naquele tempo remoto, a que me referi, um estudante aspirava à elevada altura que você quis alcançar de um só salto, tinha que se preparar e exercitar-se desde o berço para a carreira que devia seguir. A natureza interna e externa se fazia visível à sua vista, ano após ano, à medida que progredia. Ele não era admitido à ini ciação prática senão quando nenhum desejo terrestre encadeava a sublime faculdade, a que se dá o nome de Imaginação, quando nenhum desejo carnal anuviava a essência penetrante, chamado Intelecto. E, assim mesmo, quão poucos, e isto dos 4melhores, alcançavam o último mistério!Com mais felicidade do que eles chegavam os seus antecessores às santas glórias, cuja mais consoladora porta é a Morte!Zanoniinterrompeu-se, e uma nuvem de tristeza e reflexão obscurecia a sua celestial beleza.- E há, realmente, além de sie Mejnour, outros que pretenderam possuir os mesmos atributos e atingiram os mesmos segredos que você?- Existiram outros antes de nós, mas, agora, apenas nós dois, desse número, ficamos vivendo neste mundo.- Impostor! Você se traia simesmo! Se aqueles outros triunfaram da Morte, porque deixaram de existir?- Filho de um dia! - respondeu Zanoni, com tristeza; - não lhe disse já que o erro da nossa ciência era o esquecimento dos desejos e das paixões que o espírito nunca pode alcançar total e permanentemente, enquanto esta matéria carnal o envolve? Pensa que não é triste renunciar a todos os laços humanos, a toda a amizade, a todo o amor, ou ver, dia após dia, desaparecer da nossa vida os afetos, a amizade e o amor, como se desprendem as folhas da haste? Admira-se de que, com o poder de viver tanto tempo quanto durar o mundo, muitos dos nossos preferiram morrer? Antes deveria admirar-se que existiam ainda dois seres tão fortemente aderidos à terra! Pelo que toca a mim, confesso que o mundo ainda tem atrativos. Tendo eu chegado aos últimos segredos, quando me achava na flor da juventude, a juventude faz brilhar com suas belas cores tudo o que me rodeia; respirar é ainda prazer para mim. A frescura, ao meu ver, conserva-se sempre no semblante da Natureza, e não há erva em que eu não descubra algum encanto, e que não me revele alguma nova a maravilha.O mesmo que sucede com a minha juventude, dá-se com a idade madura de Mejnour; este lhe diria que a vida para ele não é mais do que o poder de examinar; e que, enquanto não tiver esgotado todas as maravilhas que o Criador semeou na terra, não desejará novas habitações onde o seu renovado Espírito possa seguir explorando. Nós somos os tipos das duas essências do que é imortal:a Arte, que goza, e a Ciência, que contempla! E agora, para que esteja contente de não haver chegado a obter os segredos, saiba que a idéia deve estar tão absolutamente despreendida de tudo quanto é capaz de ocupar e excitar os homens, que é preciso viver sem cobiçar, amar ou odiar alguém ou alguma coisa; compreende que, para um homem ambi cioso ou para quem ama ou odeia, aquele poder é inútil. E eu, por fim, ligado pelos mais comuns laços da vida doméstica, em conseqüência da que a minha vista espiritual está obscurecida, eu, cego e sem auxílio, peço-lhe a ti, homem burlado e descontente, peço-lhe que me dirija, que me guie:onde estão a minha mulher e meu filho? Ah! Diga- me, fale! Cala-se? Oh! Veja, agora, que não sou feiticeiro nem espírito malévolo? Eu não posso dar- lhe o que as suas faculdades lhe negam, não posso acabar o que o impassível Mejnour não pôde conseguir; porém posso fazer-lhe outro presente, talvez o mais belo, posso reconciliá-lo com o mundo quotidiano, e estabelecer a paz entre você e a sua consciência.- Você me promete?- Sim; juro-lhe!Glyndon fitou Zanonicom firmeza, e acreditou nele.

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