Goethe

   Era tão bom rapaz... ajudava-me a viver... Tinha uma letra tão bonita! Mas um dia começou a andar triste, metido pelos cantos, veio-lhe uma febre terrível, até que ficou como vê... Quer que lhe conte como foi? Interrompi a torrente de palavras da pobre velha e perguntei-lhe que tempo era aquele em que o filho dizia ter sido tão feliz. — Pobre tonto! — respondeu ela com um sorriso de dó. — Foi o tempo em que ele esteve doido varrido. Não se cansa de falar no tempo em que esteve no hospital completamente inconsciente. Estas palavras deixaram-me como que assombrado por um raio. Dei à velha uma moeda de prata e afastei-me dali apressadamente. — Eras feliz nesse tempo! — exclamei eu, dirigindo-me a passos rápidos para a cidade. — Eras tão feliz como um peixe na água! Deus do Céu! Será então destino do homem só ser feliz antes de possuir o uso da razão e depois de o perder? Pobre louco! Quanto invejo a tua loucura, a tua perturbação dos sentidos! Vais cheio de esperança, em busca de flores para a tua rainha em pleno inverno... e afliges-te por não as encontrares, sem compreenderes porque não as encontras. E eu?... Eu... caminho sem esperança, sem rumo, e regresso a casa como dela saí. Tu imaginas que serias um alto potentado se os Estados Gerais te pagassem! Feliz criatura, que assim podes atribuir a um obstáculo terreno a tua desdita! Não sentes nada! Não sentes que é na desordem do teu espírito, na ruína do teu cérebro que está a tua miséria... miséria de que nem os mais poderosos reis da terra te podem libertar! Que morra sem conforto, no maior desespero aquele que rir do enfermo que for em busca de umas águas longínquas, que agravarão a doença, dando-lhe mais rápida e dolorosa morte; aquele que, numa atroz injúria invetivar o infeliz que, para dar tréguas aos seus remorsos e pôr fim aos sofrimentos da sua alma, for em peregrinação ao Santo Sepulcro! Cada passo que der na terra dura e inculta, por caminhos áridos, que lhe magoam os pés descalços, é uma gota de bálsamo nas chagas da sua alma, e cada dia que passa é para o coração do peregrino o alívio do pesado fardo sob que verga a sua existência.

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