“Que o seu coração não se torne vaidoso por causa daquilo que sabes. Aconselha-te tanto junto do ignorante quanto do sábio. Porque não se atinges os limites da arte. E não existe artesão que tenha adquirido a perfeição. Uma palavra perfeita está mais oculta que a pedra verde. Encontra-se no entanto junto das criadas que trabalham na mo.”
Henri Durville
Mas não é senão depois de longos trabalhos e de sábios estudos que esse poder é conferido ao adepto; deve franquear muitos estados antes de cingir esta coroa. Estes estados da iniciação chinesa são figurados pelas seis maneiras em que o Dragão é representado; são também transformações daqueles que são chamados a seguir o caminho.
É preciso deixar a matéria, simbolizada pela Água, que é a mãe universal e o seio onde se criam formas para ganhar o céu do Espírito. O Dragão, dissemos, pode viver na água, sobre a terra e no ar.
Eis aqui as seis imagens que a tradição desenha:
1º. O Dragão oculto. O animal sagrado está metido no fundo das águas, o espírito está oculto na matéria; não experimenta nenhum desejo de subir à superfície, de sair de sua condição atual, de franquear, de evolucionar. Não conhece o Espírito que o criou. Não está preso à terra, às necessidades e aos prazeres do corpo, às satisfações sensuais, ao ganho material. Está ligado ao mundo físico, sem conceber coisa alguma. O
ser ignora a sua verdadeira essência, a sua verdadeira natureza: está despojado de si mesmo.
2º. O Dragão no arrozal. Saiu das águas, tomou a consciência do mundo exterior. Está sobre a terra, mas sobre a terra lamacenta que afunda sob o seu peso. Caminha através dos altos caules do arrozal, agitando os brotos da planta pela ondulação do corpo. É o primeiro despertar da natureza espiritual. O sentimento da pesquisa vem ao espírito mas sob a forma de uma curiosidade passageira e sem fim. Um vago sentimento lhe mostra que, ao lado da água que é a matéria, um outro lado de vida, o ar, o mundo espiritual existe.
Mas esta sensação não produz nenhum fruto, não anima nenhuma mudança. É uma constelação e nada mais. Entretanto, uma primeira luz de inteligência começa a apontar. Certamente, o Dragão vive sempre em baixo sobre a terra, preso aos desejos materiais, que lhe parecem as únicas realidades.
Mas, ao fundo de sua baixeza, ele começa a compreender que tem asas, entrevê, como um sonho, a alvorada do céu espiritual.
3º. O Dragão visível. Segundo a lenda, o Dragão eleva-se ao cimo das Águas gementes. É, sem dúvida, um desses períodos que fazem transbordar todos os rios e que inundam os campos.
Então, o Dragão é arrancado da terra pelas mesmas águas que o tinham preso à terra. É que ele nada à sua superfície em vez de deslizar ao fundo. É que ele, o ser humano, se eleva acima de seu plano primitivo; vê um conjunto do mundo; por mais restrita que seja esta vista, ela o instrui da vida exterior. Percebe nitidamente a existência do Espírito que fez este mundo admirável; compreende que a sua existência é necessária. Mas quanto é ainda retido no transbordamento de suas ondas revoltas!
Concebe a existência do Espírito; vê toda a beleza; mas a força de vontade lhe falta para tentar elevar-se até ele.
4º. O Dragão saltitante. Neste momento, o ser compreendeu que não deve ficar no meio mórbido.
Encontrou a terra firme, que lhe permite levantar, mas não tem a mínima consciência de suas asas; não pensa senão em se desprender para subir em um vôo esplêndido. Aspira a este mundo celeste do espírito do qual compreendeu a beleza, mas o ar o atrai tanto como a terra.
Possui certos meios, porém, deve adquirir outros. Não pode voar; não pode dar senão saltos que recaem sem cessar na vida material. A luta que sustenta é penosa e dolorosa. Feliz daquele que não a tem renunciado quando sucumbiu, porque a vitória exige a continuidade do esforço.
"Neste momento - diz o Yi-King - ele é como o peixe que sai da água, com a vontade, mas sem os meios de desaparecer".
É então o momento da escolha decisiva. Duas sendas se abrem diante da alma humana em trabalho:
a. Apelo do Espírito. - Depois de mil ensaios infrutíferos, o Dragão, cansado de seus saltos inúteis, pode sentir subitamente as suas asas, abri-las completamente e subir em pleno céu, arrancando-se para sempre às coisas da terra. E' o apelo do Espírito, triunfante de todas as forças materiais, dos prazeres e dos apetites, dos temores e das violências. E' a perfeita união com Deus que, em via de cumprimento, revela ao ser seus verdadeiros meios de ascensão.
b. Apelo da Matéria. - O Dragão está cansado ainda de seus saltos, mas não tenta abrir as asas; não padece tão violentamente o apetite do céu para as abrir de um só golpe, e desce para a lama; entra na água primitiva; renuncia ao céu do Espírito.
Neste momento, apresenta-se o problema absoluto: é preciso avançar ou recuar. O monstro alado desaparecerá no azul dos espaços celestes? Recairá nas profundezas dos abismos materiais? E' o jogo da grande luta que todos devem sofrer.
5º. O Dragão volante. Enfim, achou a sua Senda no domínio do Espírito. Voa e plana nos ares; desprende-se e evoluciona para q apelo divino das alturas. E' aí que se encontra a sua verdadeira pátria. Vai atingi-la, quebrando os seus laços, renunciando aos vãos fantasmas e às vãs miragens da terra. Goza a profunda alegria do iniciado; opera na plenitude de seu verdadeiro elemento. Penetra nos ritmos divinos que ele reconhece e que o arrebata na sua harmonia reencontrada. Pode colocar-se sobre a terra; mas subirá sempre, como o verdadeiro iniciado que não pode abandonar um momento o reino do espírito senão para socorrer aqueles que sofrem, mostrar a vida àqueles que a procuram, curar aqueles que estão doentes, praticar, em uma palavra, este altruísmo que é um dos fins práticos da alta iniciação.
6º. O Dragão planejante ou nivelador. Enfim, ao sexto e último estado o iniciado venceu todas as provas; sua missão não é mais da terra; plana no éter sobre o coração do sol, e o sol não o atrai. Ele não tem mais esforço a fazer para se manter nessas alturas. As altas atitudes povoam-se do coro dos inumeráveis astros; a grande calma dos espaços siderais acalma e espalha as suas faculdades sublimadas. Este azul, que a tanto custo reuniu, é o seu verdadeiro elemento; mantém-se sem fadiga.
Sua alegria é infinita e contínua. Ele sabe que não acabará mais; está livre de entraves; achou, enfim, a sua Senda; vive plenamente a vida de Espírito.
Concebeu a Unidade divina. Percebeu que todos os ritmos que o encantaram outrora não são senão reflexos desta Unidade perfeita.
Estes ritmos lhe são familiares e deles participa; estão nele porque são eles que o formaram e os goza de pleno acordo.
Aqui termina o Ciclo humano. Aqui termina o ensinamento dos iniciados chineses. Depois, quando o espírito do homem atingiu a esta esfera de harmonias, entra ele em um Nirvana, na fusão completa com o Criador, nessas claridades diante das quais todos os sóis não são senão sombras.
É a Paz definitiva, o inacessível Nirvana.
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